Engenharia civil
A engenharia civil é o ramo da engenharia que engloba a concepção, o projeto, construção e manutenção de todos os tipos de infraestrutura necessários ao bem estar e ao desenvolvimento da sociedade, além da preservação do ambiente natural. Desta forma, esta área dedica-se à criação de edifícios, pontes, túneis, usinas geradoras de energia, indústrias e inúmeros outros tipos de estrutura.
Desde o início da história, os humanos passaram a construir seus próprios abrigos utilizando os elementos naturais ao seu redor. Posteriormente, as estruturas adquiriram características cada vez mais complexas, reflexo do desenvolvimento das técnicas. Passou-se então, a utilizar conhecimentos científicos nesta área, de forma que as dimensões, a resistência e outros atributos de uma determinada obra podiam ser estimados. Novos materiais passaram a ser utilizados, sobretudo ferro e cimento, que possibilitaram o surgimento das grandes estruturas que hoje compõem o cenário do mundo moderno.
Desta forma, a formação de um engenheiro civil é fortemente ligada às ciências exatas. Contudo, um bom profissional deve conter muitos outros atributos, principalmente habilidades em comunicação e de análise racional dos fatos, além de seguir um código de ética, visto que suas obras influenciam significativamente em todos os segmentos da sociedade. Dada a vasta abrangência, a engenharia civil divide-se em vários campos específicos, desde geotecnia, mapeamento, até transportes, construção e estrutural, dentre muitas outras.
A designação "engenharia civil" foi inicialmente utilizada por oposição à de "engenharia militar".[1] Designava assim, toda a engenharia não militar. Com o passar do tempo e na maioria dos países, o termo passou a ser utilizado num âmbito mais restrito, referindo-se apenas ao ramo da construção, com os outros ramos da engenharia a receberem designações distintas (ex., industrial, agrícola, posteriormente outras).[2] Contudo, em alguns países como a Bélgica, a Dinamarca, a França, a Noruega e a Suécia, os engenheiros não militares são ainda genericamente referidos como "engenheiros civis", independentemente da sua especialidade ser a construção ou outra (mecânica, química, eletricidade, etc.).
“ | Engenheiros civis constroem a infraestrutura do mundo. Fazendo isso, eles moldam a história das nações. | ” |
Desde o início da existência humana, conhecimentos e habilidades de engenharia tem sido necessários para evolução do padrão de vida. A partir do momento em que tribos deixaram de ser nômades, surgiram assentamentos que necessitavam de estrutura necessária para abrigo e proteção que, ao longo do tempo, cresceram em complexidade. Ao decorrer dos séculos, a grande demanda por estruturas cada vez maiores e mais eficientes impulsionava o surgimento de novas técnicas e a formação de profissionais habilitados para assumir tal responsabilidade. Entretanto, a profissão de engenheiro civil só foi reconhecida oficialmente a partir da Revolução Industrial.[3]
Antiguidade[editar | editar código-fonte]
São diversas as obras remanescentes que atestam o desenvolvimento da engenharia civil ao longo de milênios. Os registros escritos destas construções, contudo, se perderam no tempo. Grandes obras de engenharia surgiram há mais de cinco mil anos na Mesopotâmia, embora haja poucos edifícios remanescentes. Os sumérios que habitavam a região construíram muros e templos e criaram canais para irrigação. Ainda na mesma região surgiu a pavimentação, feita com pedras achatadas colocadas nos trajetos mais movimentados das cidades. Ainda na Mesopotâmia há registro da primeira ponte feita de pedra, que se estendia sobre o rio Eufrates. Até então, as pontes eram feitas somente com madeira.[4]
Os pérsios, ao longo do tempo e de seus vastos domínios, foram responsáveis por criar novas e eficientes técnicas de irrigação, além de inovarem nas técnicas construtivas de pontes, especialmente para fins militares. No Antigo Egito, dentre as mais notáveis obras de engenharia destacam-se as Pirâmides de Gizé, feitas há mais de quatro mil anos, e a cidade de Alexandria (durante a era de Alexandre, o Grande), na qual foi concebido um grande farol, não mais existente. Contudo, na Grécia Antiga, houve, pela primeira vez, a conexão entre a engenharia e a ciência pura, sendo um dos primeiros trabalhos considerando aplicações práticas de princípios físicos e matemáticos atribuído à Arquimedes, que criou um sistema capaz de transportar água para diferentes elevações.
Durante a expansão do Império Romano, houve o surgimento de novas técnicas construtivas, especialmente a partir da grande oferta de matérias-primas e trabalho escravo. Embora não tenha grande ligação com a ciência, a engenharia praticada pelos romanos estava fortemente ligada ao pragmatismo. As grandes estruturas eram voltadas sobretudo para bens públicos, como aquedutos, portos, mercados, pontes, barragens e estradas. Vitrúvio foi o autor de um dos manuscritos mais antigos sobre engenharia, no qual descreve as técnicas e habilidades que um profissional deve dominar, como conhecimentos científicos, filosóficos e éticos, dentre outros. Os romanos também foram os primeiros a utilizar concreto em suas obras, quando descobriu-se que uma mistura formada principalmente por cinzas vulcânicas solidificava-se e dava origem a um material tão duro quanto as rochas.[5]
Na Índia a maior parte das construções eram feitas com madeira. Contudo, a partir do surgimento do budismo, novos e grandes templos e monastérios foram construídos no topo e nas bordas das montanhas, o que exigiu novas técnicas que faziam o uso de pedras e rochas. De forma similar, o hinduísmo motivou o surgimento de grandes templos construídos com pedras. As técnicas de engenharia na China, por outro lado, desenvolveram-se de forma quase independente àquelas do mundo ocidental. Os chineses utilizavam-se da grande variedade de matérias primas existentes em seu território para construção das fundações de pedra e casas de tijolos e telhados de argila. Destaca-se, ainda o surgimento de pontes suspensas antes feitas com fibras de bambu e posteriormente com correntes de ferro, além dos pagodes, templos em forma de torres. Contudo, a mais notável obra ainda remanescente é a Muralha da China, que se estende por milhares de quilômetros e cuja construção iniciou-se em 220 a.C.[6]
No continente africano ao sul do deserto do Saara, as obras com estilos mais simples utilizavam-se dos materiais existentes e dependiam da cultura das milhares de etnias diferentes do continente. Destaca-se, contudo, um local de cunho religioso, o Grande Zimbabwe, cuja origem remonta ao século XI. Na América, por fim, as grandes civilizações inovaram em técnicas que os permitiram criar grandes templos, especialmente de cunho religioso. Durante a civilização Maia, muitas grandes obras foram realizadas, das quais destaca-se a cidade de Teotihuacan. Os Incas, séculos depois, estenderam seus domínios na cordilheira dos Andes e criaram elementos de infraestrutura como pontes, estradas e complexos urbanos, centralizados na então capital, Cusco. Dentre os principais feitos dos Astecas, contemporâneos dos Incas, destaca-se a cidade de Tenochtitlán, capital do império dotada de complexos componentes urbanos, localizada numa região pantanosa no centro de um lago.[7]
Período medieval[editar | editar código-fonte]
O Império Romano, devido à sua grande extensão e falta de governo central, não conseguiu se manter unido e chegou ao fim no ano de 476. Muitas das obras de infraestrutura, inclusive estradas, aquedutos e portos então existentes, foram demolidas para construção de fortificações. Durante todo o período medieval, quase não houve avanços científicos, o que afetou também o desenvolvimento de técnicas de engenharia, que passaram a se restringir a conceitos práticos pouco estruturados. Os árabes, sobretudo durante o período da expansão islâmica, incorporaram técnicas romanas sobretudo utilizadas em fortificações, embora já possuíssem conhecimentos na construção de grandes mesquitas.[8]
Não havia método científico nas construções, pelo que eram baseadas no sistema de tentativa e erro, sendo numerosos os exemplos de colapso de estruturas. Neste período nota-se, ainda, a criação de grandes fortificações em castelos, para prevenir invasões. Houve um avanço na utilização de rodas de água para transportar água e mover moinhos. Ocorreram também avanços na construção de canais navegáveis.[9]
Era moderna[editar | editar código-fonte]
A partir da Renascença, o profissional engenheiro passou a ganhar importância e reconhecimento, ao contrário do período medieval em que projetos eram criados por artesãos. Um dos pioneiros do período foi Filippo Brunelleschi, que projetou o domo da catedral de Santa Maria del Fiore em Florença. Ainda com o surgimento da impressão de livros, começaram a surgir os primeiros manuais com técnicas de projeto e construção.[10]
Posteriormente, a Revolução Industrial começava a mudar radicalmente o perfil da Inglaterra, o que posteriormente viria a acontecer no restante da Europa. A população começou a migrar da zona rural para as cidades para trabalharem nas indústrias. As obras estruturais necessárias para o desenvolvimento industrial era geralmente conduzida por engenheiros militares. No entanto, em 1768, o inglês John Smeaton se autodenominou 'engenheiro civil' para diferenciar-se dos profissionais militares, criando assim uma nova e distinta profissão. Poucos anos depois criou a Sociedade dos Engenheiros Civis, com a finalidade de reunir profissionais para conceber e executar grandes projetos.[11]
A Revolução Industrial trouxe consigo novas técnicas e materiais pertinentes à engenharia. A Ponte de Ferro, no Reino Unido, foi a primeira ponte de arco construída somente com ferro fundido, o que é considerado um marco na história. Conforme ocorria o crescimento econômico, era cada vez maior a necessidade de se acelerar os transportes. Por isso, houve grande ampliação do sistema de canais e posteriormente surgiu a primeira ferrovia. A utilização do ferro como elemento estrutural causou grandes mudanças, especialmente por conta de sua resistência, capacidade de pré-fabricação e facilidade de montagem. Os engenheiros civis, a partir de então, puderam inovar no formato dos prédios, além de agilizar sua construção. Houve ainda inovação no que se refere à construção de túneis, a partir do primeiro construído sob o rio Tâmisa em Londres para a criação do sistema metroviário londrino.[12]
A partir do século XX, a engenharia como um todo passou a se desenvolver e se especializar sobretudo por conta dos avanços científicos e fundamentações teóricas do comportamento dos materiais. A partir de então surgiram grandes estruturas antes inimagináveis, como o Viaduto de Millau, na França, a mais alta ponte para veículos do mundo, e o Burj Khalifa, o mais alto edifício do mundo, com mais de oitocentos metros de altura. A Sociedade Americana de Engenheiros Civis compilou uma lista com as sete maravilhas do mundo moderno, das quais destacam-se o Eurotúnel, sob o estreito de Dover entre o Reino Unido e a França, o canal do Panamá, que liga o oceano Pacífico ao Atlântico e a Usina Hidrelétrica de Itaipu entre o Brasil e o Paraguai.[13]
Formação
A demanda de profissionais especializados logo demandou o surgimento de centros de ensino voltados para a engenharia. O primeiro deles foi a École Polytechnique em Paris, criada no ano de 1794. Várias décadas depois academias surgiram pela Europa e Estados Unidos, onde, em 1835, formaram-se os primeiros engenheiros civis pela Instituto Politécnico Rensselaer.[14]
É necessária para a formação de um engenheiro civil uma forte base na área de ciências exatas, especialmente matemática e física, além da análise de dados, concepção, planejamento e execução de sistemas, identificação e solução de problemas e uso prático de técnicas e habilidades. Desta forma, o curso geralmente apresenta uma combinação de várias especialidades científicas, como mecânica, hidráulica, geotécnica, ciências dos materiais e análises estatísticas. Estes conhecimentos passam a ser aplicados para o desenvolvimento de projetos, especialmente com o uso de ferramentas de desenho assistido por computador (CAD). O período de formação em engenharia civil leva entre três anos para o grau de licenciatura ou cinco anos para o grau de mestrado. São grandes ainda as opções de especialização, dada a vasta gama de temas que um curso de engenharia civil abrange. Deve haver ainda uma preocupação durante a formação no que se refere a conceitos de legislação, economia e ética, uma vez que as atividades de um engenheiro civil afetam grande parte dos segmentos da sociedade.[14][15][16]
Atuação profissional
Um engenheiro civil é um profissional capacitado para conceber, projetar e construir os mais diversos componentes da infraestrutura necessários para o bem-estar e desenvolvimento da sociedade. O local de trabalho de um engenheiro varia conforme a especialidade escolhida, embora a maioria trabalhe em firmas de consultoria, que criam projetos e soluções para construção de determinada estrutura. Existem ainda muitas possibilidades no setor público, desde o âmbito municipal até federal, além da possibilidade de atuar em carreira militar ou no setor industrial. Tipicamente o engenheiro precisa visitar os locais de obra e trabalhar com diferentes equipes técnicas especializadas.[17] A Associação Americana de Engenheiros Civis define engenharia civil como sendo:[18]
“ | ... a profissão na qual o conhecimento físicos e matemáticos enriquecidos pelo estudo, experiência e prática são aplicados de forma correta para desenvolver meios de utilizar, economicamente, os materiais e as forças da natureza para o progressivo bem-estar da humanidade ao criar, melhorar e proteger o ambiente, ao criar instalações para a convivência da comunidade, indústrias e meios transporte e ao fornecer estruturas para o uso de toda a humanidade. | ” |
Em geral, um engenheiro civil deve ser um profissional devidamente preparado com base em aspectos teóricos que lhe conferem uma habilidade de análise racional das situações. Desta forma, é necessária uma sólida formação em ciências exatas, especialmente matemática e física. Além disso, o profissional deve seguir um código de ética, dada a importância de sua função na sociedade, que inclui realizar seu trabalho de forma responsável, buscando sempre contribuir ao máximo para o bem estar da sociedade. Um atributo indispensável de um engenheiro civil é a sua capacidade de comunicação e liderança, visto que frequentemente é necessária a coordenação entre diversos tipos de profissionais para uma determinada finalidade.[19]
Existem na maioria dos países associações de engenheiros civis que buscam a troca de conhecimento e a divulgação e aperfeiçoamento de técnicas. As pioneiras e atualmente mais importantes são o Instituto Britânico de Engenheiros Civis e a Sociedade Americana de Engenheiros Civis. Para exercer a profissão, o engenheiro civil precisa obter certificação e licença formal, tipicamente fornecida por estas associações.[20] No Brasil, a certificação é fornecida pelo Conselho Federal de Engenharia e Agronomia, através de seus conselhos regionais.[21] Em Portugal, a validação do diploma é feita pela Agência de Avaliação e Acreditação do Ensino Superior.[22]
As tendências atribuídas para a engenharia civil estão diretamente relacionadas às transformações naturais, sociais e econômicas que o mundo tem experimentado nas últimas décadas. Com a migração da população para as cidades será necessário a utilização racional dos recursos naturais, utilizando meios sustentáveis de desenvolvimento. Será necessário o aumento, melhoria e manutenção da infraestrutura urbana, além da maior preocupação no fornecimento de água, energia aliados à correta disposição dos resíduos gerados. Desta forma, o engenheiro tem papel fundamental na determinação dos rumos do desenvolvimento, tendo em vista os benefícios à sociedade e a proteção do ambiente.[23]
A engenharia civil, por sua própria natureza, é uma área na qual erros causam grandes consequências. Desta forma, o profissional deve desenvolver com o máximo de atenção para evitar erros atribuídos a omissões, falta de planejamento, erros durante o processo de construção e relacionados à qualidade dos componentes. Há a necessidade de avaliação cuidadosa do ambiente na qual determinada estrutura será instalada, a fim de garantir sua durabilidade a longo prazo. Um engenheiro precisa, ainda, ser capaz de aprender com erros anteriores relatados em outras obras, de forma que haja minimização dos riscos. Dentre os exemplos notáveis de falhas estão o desabamento do teto do terminal 2 do Aeroporto de Paris-Charles de Gaulle em 2004 e a Ponte Tacoma Narrows que, em 1940, entrou em colapso por ação do vento.[24]
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